segunda-feira, 3 de abril de 2017

Só isso?


                É triste admitir, mas cada dia mais creio que nos apaixonamos pela pessoa que criamos na nossa cabeça. Talvez por inocência, talvez por esperança e um resquício de amor romântico que insiste em permear nossos pensamentos levando-nos a imaginar “a pessoa ideal”. Tão frustrante é ver que “aquele cara” na verdade é “só isso? ”. Que classe de arrogância se apodera de nossos pensamentos para chegar a essa conclusão? Será mesmo arrogância ou amor próprio?
                Ok, a “metade da laranja” sempre me pareceu algo terrível. Sério. Me aterrorizou desde sempre pensar que dependo de alguém para ser completa. No entanto, a ideia de ter um companheiro para compartilhar as coisas boas da vida sempre me agradou. Claro, isso como eu disse, é uma ideia. Na vida real, a experiência mais próxima que tive disso foi alguém querendo dividir as coisas boas. Percebi aí a diferença entre dividir e compartilhar. Foi difícil primeiramente admitir isso, depois fazer algo sobre isso e mais tarde perceber que esse aprendizado se deu por meio de muito tempo de vida, lágrimas e um julgamento bem duro da sociedade (afinal, terminar um relacionamento perto dos 30, para uma mulher, é quase um suicídio social).
                Apesar da descrença ser cada vez mais presente, às vezes, bem às vezes mesmo, aparece alguém que assopra aquela brasinha no nosso coração e levantam-se labaredas: “Uau! Alguém para compartilhar! Alguém que eu posso fazer feliz e que pode me fazer feliz também! ”. Aí passado um tempo (cada vez mais curto), olhamos para essa pessoa, pensamos: “Anh? Esse é o fulano?”. O que vem a seguir já é sabido: decepção. E cada vez se fazem verdadeiros os versos “lágrimas por ninguém, só porque é triste o fim. Outro amor se acabou.” E dizemos “ADEUS”.
                Joseph Campbell, em “O poder do mito” diz “Penso que o que estamos procurando é uma experiência de estar vivos, de modo que nossas experiências de vida, no plano puramente físico, tenham ressonância no interior do nosso ser e da nossa realidade mais íntimos, de modo que realmente sintamos o enlevo de estar vivos.” Talvez o problema seja a nossa concepção sobre o “enlevo de estar vivos”, essa sensação que muitas vezes buscamos nos outros e, na verdade, devamos em cada momento, momentinho da nosso vida, nas pequenas realizações.
                E quando o pessimismo vier dizendo “outra vez na pista, outra vez os sonhos despedaçados e apenas a alegria de ter percebido logo”, devemos pensar que todos somos resultados de nossas experiências e, certamente, ficamos mais “sóbrios” quando se trata de relacionamentos. A embriaguez do encantamento amoroso fica cada vez mais curta e a vida vai ficando bem mais sem graça, sem tanto sabor, sem tanta magia. E isso é necessariamente ruim? Afinal, já passou do tempo de achar que a abóbora vai virar uma carruagem, né?
Ver as coisas sem romantizá-las nos trará certamente uma vida emocional e mental mais saudável. Veremos a graça, o sabor e a magia em outros aspectos. É quase como adaptar o paladar: aprendemos a deixar de lado aquela coxinha, nhoque ou pizza cheia de queijo por uma salada com filé grelhado.Sai a gordura, entram os nutrientes. E como em uma reeducação (alimentar ou não), vemos o resultado a médio e longo prazo. A morte do amor romântico é o nascimento da maturidade emocional. Nesse sentido, sai a fantasia e entra o entendimento de viver intensamente cada momento pensando que o outro é na verdade o sortudo da vez. Se ele será o sortudo para toda a vida, bem, essa é outra história. 




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